Desconfortada

Eu quero uma blusa confortável. De um tecido mole e frio, que se ajuste ao corpo sem apertar. Que quando eu levante o braço não apareça o sutiã ou, por outro ângulo, metade da barriga. Cuja gola não deseje me esganar a cada cinco minutos. Feita desses panos que mantêm a temperatura do corpo. Preta. E, por favor, pelo menos 5cm passando do cós da calça, para esconder o cofrinho na cadeira do ônibus e da praça de alimentação.

Eu quero uma calça confortável. De um jeans que não aperte, que não esquente e que não coce. Nem justa, nem folgada. E que, principalmente, caiba meus quadris e minhas pernas. Quero uma calça para brasileiras, e que seja flexível, para eu não precisar desabotoar quando sentada comendo pizza. Ou McDonnald’s. Que caiba um cinto bonito sem expulsar os pneuzinhos. Que eu jamais precise fazer a bainha.

Eu quero um sutiã confortável. Que sustente e que (ui!) aumente; que valorize minha TPM, mas não me cause dor de cabeça. Um que me faça acreditar que é melhor viver com ele do que sem. Que não fuja do lugar quando eu deite de lado e que não atrapalhe em nada o meu sono. Cujas alças sempre adivinhem o tamanho ideal e com abertura na frente, que é muito mais sexy, hihihi.

Eu quero uma calcinha confortável. Uma média entre o fio dental e o pára-quedas. Que não aperte, que não marque e que não insista em entrar onde poucos têm o privilégio. Que eu possa usar com vestido de festa e calça jeans. Que seja fácil de lavar durante o banho e que tenha alguma piada inteligente, só pra ilustrar.

Eu quero um sapato confortável. Que não faça calo, nem quando novo nem quando velho. Que eu nunca precise “amaciar”. Se tiver salto, que seja pequeno. Se for fechado, que não ignore que a sutil porém importantíssima existência do dedinho. Que tampouco empurre a unha do dedão, que não faça o pé suar, que seja fácil de calçar. Se for sandália, que jamais se parta na parada do ônibus naquele dia de chuva. E que seja de oncinha, só pra fazer charme.

Eu queria viver mais confortável. Brincos que não furassem atrás da minha orelha quando eu deitasse, fivelas que jamais beliscassem, saias que jamais levantassem (nas horas inapropriadas, logicamente). Uma farda que não me matasse de calor no trabalho. Meias que nunca furassem. Enfim, roupas com as quais eu pudesse adormecer e acordasse pensando que estava de babydoll.

Mas, pelo visto, esse tipo de produção é difícil de encontrar nesse nosso mundo tão plástico, em que damos três pulinhos para entrar naquele jeans, quando tudo que nosso corpo quer é sair dele.

Confortável mesmo é ficar nu. Se você estiver confortável consigo mesmo, é claro.

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Imagem: Getty Images